Sem VR no Pix, governo propõe teto nas taxas para conter inflação dos alimemtos

O aumento da inflação dos alimentos acendeu o alerta no governo e intensificou os debates sobre possíveis mudanças no Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT).

Sem VR no Pix, governo propõe teto nas taxas para conter inflação dos alimemtos

A proposta de permitir o pagamento de vale-refeição (VR) e vale-alimentação (VA) via Pix foi rapidamente descartada pelo governo. Apesar de ter sido cogitada por setores da equipe econômica como medida para conter a inflação dos alimentos, o risco de desvio de finalidade e impactos legais levou o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) a abandonar a ideia. Agora, a prioridade é estabelecer limites nas taxas cobradas pelas operadoras de benefícios.

Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), essas taxas variam entre 3,5% e 4,5%, definidas livremente pelas empresas. Embora o desconto não afete diretamente o trabalhador, ele onera bares, restaurantes e supermercados — que acabam repassando parte desses custos ao consumidor final.

Taxas não impactam diretamente a inflação dos alimentos

De acordo com Lúcio Capelletto, presidente da ABBT, a taxa de transação permanece fixa mesmo com a variação nos preços dos alimentos. Isso significa que, embora o valor absoluto pago pelas empresas aumente, a alíquota não se altera.

“Não faz o mínimo sentido pensar que a taxa esteja impactando a inflação dos alimentos, nem que seja a responsável por dificultar a alimentação dos trabalhadores.” — Lúcio Capelletto, ABBT

Além disso, Capelletto reforça que os trabalhadores pagam apenas pelo que consomem, sem acréscimos por utilizar VR ou VA.


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Mudança no formato poderia comprometer o PAT

A proposta de adotar o Pix para o pagamento dos benefícios gerou preocupação quanto à continuidade do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Segundo a ABBT, tal mudança poderia desestimular empregadores, especialmente pequenas empresas, a manterem o benefício, que é opcional.

Atualmente, 86% dos beneficiários do PAT recebem até cinco salários mínimos, o que representa cerca de 23 milhões de brasileiros. Para a associação, a conversão do benefício em dinheiro abre espaço para uso indevido — como compra de bebidas alcoólicas ou apostas esportivas — distanciando-se da finalidade original.

Mudança exigiria alteração na lei

Na esfera jurídica, especialistas afirmam que o pagamento em dinheiro, inclusive via Pix, fere a Lei 6.321/76, que instituiu o PAT. Essa legislação exige que os benefícios sejam oferecidos por meio de convênios com estabelecimentos alimentícios, não em espécie.

“Esse modelo deveria seguir lógica semelhante à do vale-transporte, com regras claras que limitem sua natureza salarial.” — Diego Gonçalves, advogado trabalhista

Para que o pagamento via Pix seja legalizado, seria necessário alterar a legislação vigente e definir que o valor não compõe o salário.

Pagamento em dinheiro traria impacto fiscal e trabalhista

A conversão dos benefícios em pagamento direto aos trabalhadores também acarreta riscos fiscais e previdenciários. Especialistas alertam que o VR e o VA poderiam ser considerados salário in natura, gerando encargos adicionais para empresas e funcionários.

Esses impactos incluem:

  • Contribuições maiores ao FGTS;
  • Aumento de encargos sobre 13º salário e férias;
  • Incidência de Imposto de Renda sobre os valores recebidos;
  • Perda de incentivos fiscais do PAT, como a dedução de até 4% do IRPJ.

“Valores pagos com habitualidade e sem controle configuram parcela salarial, conforme o artigo 457 da CLT.” — Sérgio Pelcerman, advogado

Debate se intensifica com avanço da inflação

A discussão sobre o futuro do PAT ganhou força com a alta da inflação dos alimentos. O IPCA acumulado em 12 meses até abril de 2025 é de 5,48%, bem acima da meta de 3% para o ano. Diante desse cenário, alternativas para aliviar o custo da cesta básica vêm sendo consideradas pelo governo.

A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) chegou a sugerir que o pagamento dos benefícios fosse feito diretamente em conta salário, sem a intermediação de operadoras — o que, segundo estimativas, geraria uma economia de R$ 10 bilhões anuais ao setor.

“Esse custo é repassado aos preços, impactando milhões de beneficiários. As taxas somadas chegam a mais de 15% do valor transacionado.” — Nota da Abras

Governo propõe teto para taxas e aceleração de repasses

Após o recuo da ideia de utilizar o Pix, o governo voltou sua atenção para um novo plano: reduzir o tempo de repasse dos valores aos lojistas, hoje em até 30 dias, para apenas 2 dias. Além disso, estuda-se a padronização das taxas cobradas pelas operadoras, fixando um teto entre 3% e 4% no chamado Merchant Discount Rate (MDR).

Segundo Capelletto, a ABBT já apresentou propostas ao Ministério da Fazenda para reduzir essas taxas, principalmente para pequenos e médios estabelecimentos, que têm menor capacidade de negociação.

“Estamos abertos ao diálogo para discutir ajustes e aprimoramentos no modelo atual.” — Lúcio Capelletto, ABBT

No entanto, ele afirma que a associação não foi procurada formalmente pelo governo sobre mudanças no meio de pagamento dos benefícios.

Foco é modernizar sem comprometer o programa

Diante da alta da inflação e das pressões fiscais, o governo busca soluções que tornem o PAT mais eficiente, sem abrir mão de seu propósito original: garantir alimentação de qualidade aos trabalhadores. A limitação das taxas e a modernização dos repasses surgem como alternativas viáveis, ao passo que o pagamento via Pix permanece, por ora, fora de cogitação devido aos riscos legais, fiscais e sociais.